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terça-feira, 19 de abril de 2011

Tragédia Carioca - Frei Betto

          
Doze adolescentes, de 13 a 15  anos, foram cruelmente assassinados, a 7 de abril, nas salas de aula de uma  escola de Realengo, Rio. Outras tantas ficaram feridas. O criminoso, de 23  anos, disparou na própria cabeça a 66a bala saída de seus dois revólveres.
  
         Massacre como este nunca havia ocorrido no Brasil. São  frequentes nos EUA. E enchem o prato da mídia em busca de audiência. A cada  telejornal, reaparecem as fotos das crianças, o depoimento de parentes e  amigos, os sonhos que nutriam...

          Em Antígona, de Sófocles  (496-405 a.C.), a mulher que dá nome à peça rebela-se contra o Estado que a  proíbe de sepultar seu irmão. Hoje, a exploração midiática torna os corpos  insepultos. As famílias das crianças sacrificadas, ontem no anonimato, agora  ocupam manchetes e são alvos de holofotes. É a morte como sucesso de  público!

          O assassino foi o único culpado? Tudo decorreu de um  “monstro” movido por transtornos mentais? A sociedade que engendra esse tipo  de pessoa não tem nenhuma responsabilidade?

           Um gesto brutal como  o do rapaz que matou à queima-roupa 11 meninas e 1 menino não é fruto de  geração espontânea. Há um histórico de distúrbios familiares, humilhações  escolares (bulliyng) e discriminações sociais, indiferença de adultos  frente a uma criança com notórios sinais de desajustes.

          Quando  pais têm mais tempo para dedicar à internet e aos negócios que aos filhos;  adolescentes ingerem bebida alcoólica misturada a energéticos; alunos ameaçam  professores; crianças se recusam a dar lugar no ônibus aos mais velhos... o  sinal vermelho acende e o alarme deveria soar.

          O que esperar de  uma sociedade que exalta a criminalidade, os mafiosos, a violência, através de  filmes e programas de TV, e quase nunca valoriza quem luta pela paz, é solidário aos pobres, trabalha anonimamente em favelas para, através do teatro  e da música, salvar crianças de situações de risco?

          Há anos  acompanho o trabalho do Grupo Tear de Dança, que congrega jovens de baixa  renda da zona Norte do Rio. Embora seus espetáculos sejam de boa qualidade artística, sei bem das imensas dificuldades de patrocínio, de divulgação, de  espaço na mídia para noticiar suas apresentações.

          É triste e  preocupante ver o talento de um jovem bailarino se perder porque, premido pela  necessidade, ele deve retornar ao trabalho de ajudante de pedreiro ou, a bailarina, de vendedora ambulante.

          Como evitar novos massacres  semelhantes ao de Realengo? Quase dois terços dos eleitores brasileiros  aprovaram, no plebiscito de 2005, o comércio de armas. As lojas vendem armas  de brinquedo presenteadas às crianças. Os videogames ensinam como se tornar  assassino virtual.

          Há no Brasil 14 milhões de armas em mãos de  civis, das quais metade ilegais, como as duas que portava o assassino dos  alunos da escola Tasso da Silveira.

          Segundo o deputado Marcelo  Freixo (PSOL), existem no estado do Rio 805 mil armas em mãos de civis, da  quais 581 mil são ilegais, muitas em mãos de bandidos. “O cidadão que compra  uma arma para ter em casa, pensando em se proteger, acaba armando os  criminosos”, afirmou no Rio o delegado Anderson Bichara, da Delegacia de  Repressão ao Tráfico Ilícito de Armas.

          Como dar um basta à  violência se o Instituto Nobel da Noruega concede o prêmio da Paz a guerreiros  como Henry Kissinger, Menachem Begin, Shimon Peres e Barak  Obama? Monstro é tão-somente quem entra armado numa escola, num  supermercado, num cinema, e mata a esmo? Como qualificar a decisão do governo  dos EUA de, após vencer a guerra contra a Alemanha e o Japão, jogar a bomba  atômica sobre a pacífica população de Hiroshima, a 6 de agosto de 1945 (140  mil mortos), e três dias depois outra bomba atômica sobre a população de  Nagasaki (80 mil mortos)?

          Hitler e Stalin também podem ser  qualificados de “monstros” e seus crimes são sobejamente conhecidos. Mas não  há uma certa domesticação de nossas consciências e sensibilidades quando somos  coniventes, ainda que por inação ou omissão, frente ao massacre dos povos  iraquiano, afegão e líbio?

          A paz jamais virá como resultado do  equilíbrio de forças. Há nove séculos o profeta Isaías alertou-nos: ela só  vigorará como fruto de justiça. Mas quem tem ouvidos para  ouvir?

...
          O  governo Dilma, com razão, não gostou do relatório do Departamento de Estado  norte-americano sobre os direitos humanos no Brasil, divulgado semana passada.  O Itamaraty fez uma nota de protesto. É pouco. Só há uma resposta à altura: o  Brasil emitir um relatório sobre os direitos humanos nos  EUA.

          Frei Betto é escritor, autor, em parceria com  Marcelo Gleiser e Waldemar Falcão, de “Conversa sobre a Fé e a Ciência”  (Agir), entre outros livros. 
www.freibetto.org -  twitter:@freibetto

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