(Gabriel Jorge Castellá, in Paradojas existenciales)
A fé se nutre da dúvida. Claro que não é seu único nutriente, mas é o indispensável. Só os tolos e os fanáticos não duvidam.
Pieper,* em Virtudes Fundamentais, afirma que “a fé é uma segurança ‘prática’ com respeito a enunciados que não se podem fundamentar ‘teoricamente’; um ter por verdadeiro que é ‘subjetivamente’ suficiente e, ao mesmo tempo, insuficiente ‘objetivamente’”.
Em todo ato de fé não há evidência objetiva, não há uma certeza absoluta daquilo em que se deposita a fé. Na fé, fundem-se necessária, magistral e paradoxalmente a convicção e a dúvida, a certeza e a incerteza.
Pieper** refere que São Tomás nos disse que “ao contrário da intuição e conhecimento, é a própria natureza da fé que torna possível a dúvida”.
A fé ilumina sempre o caminho de quem recorre a ela. A fé nos guia ao conhecimento da VERDADE. A convicção dá firmeza e inteireza na busca-encontro da verdade. A dúvida dá a “certeza” de saber que, a VERDADE pressupõe um algo mais que o dado, feito ou conhecido até o presente.
A um homem que definia a si mesmo como “buscador da verdade”, disse o mestre:
- Se o que você busca é a Verdade, há algo que é preciso que você tenha, acima de tudo.
- Já sei, uma irresistível paixão por ela.
- Não. Uma incessante disposição em reconhecer que você pode estar errado.
Retornando à união convicção-dúvida, este compromisso – longe de ser uma contradição – faz parte de uma constante evolução, um permanente progresso do conhecimento e, portanto, da verdade, em um processo de evolução contínua.
Quando a convicção é absoluta, sem margem alguma para a dúvida, com a crença em uma falsa verdade absoluta, saímos do campo da fé para nos instalarmos no do fanatismo. Neste terreno não cresce nunca a dúvida e, portanto, tampouco a fé.
No desenvolvimento da fé não cabe o medo. Quando este cresce, a fé degenera em superstição. A verdadeira fé nunca coexiste com o medo, porque quando aquela brilha, este desaparece.
Quando a dúvida se une ao medo, a pessoa fica paralisada. A dúvida aumenta o medo e este a dúvida. Girando, sem saída aparente, em um nefasto círculo vicioso.
Se agora integramos o exposto acima, forma-se o seguinte quadro:
Convicção | |||
Fanatismo | Fé | ||
4 | 1 | ||
Pseudoverdade absoluta | Dúvida | ||
3 | 2 | ||
Superstição | Paralisia do ser | ||
Medo |
Formam-se assim, quatro quadrantes:
· o 1, onde se unem a convicção e a dúvida. É o da fé.
· o 2, onde se aliam a dúvida e o medo. É o da paralisia do ser.
· o 3, onde fundem-se o medo e a crença em uma pseudoverdade absoluta. É o da superstição.
· o 4, onde se combinam a convicção com a crença em uma pseudoverdade absoluto. É o do fanatismo.
*Pieper, Josef. Las virtudes fundamentales. RIALP, 1988. p. 303.
**Idem, p.334.
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